quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

• O fogo eterno

Foto de mim, hoje,
"Saber não ter ilusões é absoluta-mente necessário para se poder ter sonhos.", Fernando Pessoa, in "O Livro do Desassossego"

A cada dia, uma nova esperança, seguida de uma nova desilusão. Tem sido este o meu penoso viver.

Todos os dias os deuses me oferecem um novo motivo para acreditar num renascido futuro risonho. Mas, por desgraça minha, que se me colou à pele de forma indelével, nunca tarda muito, invariavelmente, para que eu deixe de crer em cada uma dessas novas oferendas. Por me parecer sempre utópica ou quase.

Já não sonho com quase nada.
Não consigo fazê-lo, de tal modo a fé abandonou a minha alma.
Já não sonho com uma nova casa.
Já não sonho com um novo emprego.
Já não sonho com concretizar a viagem dos meus sonhos.
Já não sonho com ter mais dinheiro.
Já não sonho com a descoberta de Shangri la.
Já não sonho com a posse de bens materiais.

Já só sonho em ter um novo amor.
Um amor inteiramente novo.
Ou um amor renascido das cinzas frias.
Das cinzas que, com o cair das folhas do calendário, o vento vai dispersando. Para longe. Irreversivelmente.

Só com um novo amor, creio poder voltar a sonhar com tudo o resto.
Já não sei sonhar sozinho.
Como um filho, um sonho tem de ser concebido a dois.
Os meus sonhos, como óvulos, têm de ser fecundados para nascerem. Ou então, se oniricamente estéril me tenha tornado, tenho de adoptar os sonhos de a quem me juntar.
Mas de uma forma ou de outra, tenho de sonhar acompanhado. Senão, não estarei a viver.

Hoje vou sobrevivendo. Sou uma chama acesa a que o combustível não tem ainda faltado. Até quando?...

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

• Speechless am I...

Imagem com fundo verde esperança, a cor também do pensamento expresso, tão belo quanto sábio.

Neste blog, onde os textos publicados têm sido invariavelmente autênticos testamentos, finalmente um post com serviços mínimos.

A ver se agora haverá mais comentários de leitores. Ou tão-só mais e novos leitores. Olhem que se não comentarem, eu dou mesmo cabo do patinho!... Não estou a brincar...

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

• Amor e cobardia


Confesso. Já fui cobarde* muitas vezes.

Admito mesmo mais: sempre fui cobarde. Amor e cobardia são a mesma coisa, como já li numa citação que alguém produziu antes de mim.

No julgamento que todos os deuses e alguns humanos - aqueles poucos que me prestam atenção - me fizerem, farei este acto de contrição e esperarei que este me sirva ao menos de circunstância atenuante. É que nem todos os homens terão consciência da sua cobardia e farão o mesmo que eu.

O Amor é como um carneirinho, de lã farta, alva e fofinha, pastando pachorrentamente num verde prado primaveril. Metáfora linda à primeira vista. Mas se aproximarmos a nossa visão, atrás das suas orelhitas detectaremos carraças mil!...

O Amor é algo bonito em si, mas que arrasta consigo um ror de feios paasitas. O primeiro sendo, talvez, o ódio, que domina o seu portador, o Amor, em três tempos, tantas vezes... É aquela história da ténue fronteira.

Mas há outros parasitas mais. O egoismo, a canalhice, a traição, a cobardia... Oh, como já fui cobarde a jogar o jogo da sedução... egoísta, canalha, traidor e cobarde... e como também já sofri com a cobardia alheia. De quem fingiu me amar até ao fim, já não o fazendo de verdade... e nem sequer era uma cobardia de índole intencionalmente maligna. Apenas uma cobardia estúpida.

E tende muito cuidado, gentes, que a estupidez humana é infinita, segundo Einstein, e pode ser-vos letal!... No nosso amor próprio, fere-nos mais o próximo que connosco é estúpido do que aquele que é tão-só maquiavélico.

Mas eu tudo compreendo e aceito, resignado. A punição divina que me deram, é aquela que eu mereço. E não posso querer mal a quem me feriu. Porque é inimputável. Porque nós não mandamos no nosso coração. Este é apenas um instrumento nas mãos de entidades sobre-humanas que regem o fado de cada um de nós, mortais.

Sabeis, a cobardia tem um preço. Aquele que eu sempre paguei foi o de ficar cativado sem remissão, no fim, sempre já demasiado tarde, por quem a princípio seduzia e nem tinha a convicção plena - mas, e depois também, como a poderemos ter tão cedo?... - de querer amar incondicionalmente.

E como é alto esse preço, asseguro-vos...

Aposto que Bob Marley proferiu esta máxima que lhe atribuem numa conjuntura particular dele... a de uma valente dor de corno! Provocada por um canalha que lhe andaria a tentar catrapiscar a sua companheira - que ele, Bob, deixaria andar livre para voar e ser ela mesma, sem quaisquer amarras - pelo simples gozo do jogo da sedução. Essa actividade desportiva tão canalha e tão intrínseca dos homens...

Vou terminar de vergastar o Amor, por hoje, apontando o dedo também ao sexo oposto. Que ninguém está inocente no Amor. Todos, de ambos os lados da barreira, têm a sua dose de cobardia.

Reflectindo sobre o pensamento marleyano, invento agora eu esta verdade:

"A maior cobardia de uma mulher é não contar quando o seu amor acabou, deixando o homem viver na ilusão das juras de amor eterno antes dadas por ela.", Giuseppe Pietrini
Não mais quero ser um cobarde. Mas não queria deixar de amar...

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* Tradução da citação em inglês na imagem acima: "A maior cobardia de um homem é despertar o amor de uma mulher sem ter a intenção de a amar.", Bob Marley
Nota: em ambas as citações, a minha e a de Marley, os papéis dos dois sexos podem perfeitamente ser intercambiados entre si, que o valor da verdade das expressões produzidas não sofre qualquer alteração de estado.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

• São Valentim

É o meu coraçãozito...

Está onde tu o deixaste. Aí se quedou, desde a tua partida para uma vida nova, plena de esperança. Como tu assim disseste para ti mesma e assim pretendes crer.

Eu para aqui estou arrecadado. Num espaço e tempo vazio. Mas graças aos deuses, a natureza tem horror ao vazio. E não tarda em preenchê-lo.

Não fosse a nossa separação e o caminho da minha existência não se teria cruzado com aquela, aqui bem perto, do outro lado do habitat das tágides, que é a maior amiga do sexo oposto que um homem das minhas qualidades e defeitos pode neste mundo ambicionar conhecer. E como é bom poder servir a ela com um imesurável prazer como amigo incondicional.

Não fosse eu gritar aos ventos a carência do teu abraço e eu não teria sido descoberto por uma alma gêmea do outro lado do mundo, para lá do Adamastor. Alguém que me leva a acreditar que um dia, antes de eu nascer e da minha alma vir habitar este corpo meu, ela se terá fendido em duas unidades. Uma delas ficou minha inquilina. A outra aguardou alguns anos mais para se decidir enfim, por ir viver com aquela minha semelhante que veio ao mundo na Pindorama.

Dizes-te alma solitária. Confessas que ainda assim, foi de início ao meu lado que terás encontrado outra alma que mais te compreendia e completava. Terás deixado de crer nisso, talvez.

Eu também me julgava solitário. Não mais me posso considerar tal. Não depois de ter recebido estas duas oferendas dos deuses que mencionei. Mas ainda assim, estarei no próximo dia de São Valentim só. Sem ti ou outra qualquer mulher para poder prestar as minhas homenagens nesse dia sagrado para a minha religião: a adoração da beleza feminina.

Resignar-me-ei. E talvez assim dessa sorte me metamorfizarei no poeta e filósofo maior do Amor. Que esta terra e eu próprio ainda teremos por descobrir dentro em mim. Se é isso o desígnio dos deuses... eu digo: aqui estou. No meu canto.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

• Cansei de caçar borboleta

Amar-te...

Amar-te, na tua ausência, é
não pensar senão em ti.
É estar contente com o teu contentamento
inda que deste a fonte não sejamos.
É sufocar a contínua dor
da residual permanência
de ti dentro de nós

Mas amar-te também é
ir procurar-te em todas as mulheres.
Julgar sentir o suspiro teu
no seu arfar
e não te encontrar
porque amar-te depois que te foste
é não te ver
em corpo ou lugar nenhum.
Amar-te assim é o vazio.
Má fortuna um dia ter amado
porque quedar de o fazer
não podemos mais.

Também é amar-te
não pensar somente em ti.
Cuidar que não tenhas sempre
as orelhas aquecidas.
É lutar contra nós próprios
desviando a teimosa ideia
de ti remoendo em nós.
É passar a ter atenção
a quem não a dávamos.
É escutar mais e melhor
o mundo antes longínquo
e voltar então a ti
com serenidade
para conseguir viver
sem ti
e deixar-te ser feliz
sem nós.

Se um dia, quiçá, tornares
que a coragem te não falte
porque não vai caber em ti
todo o amor que te guardo.


Esta prosa, talvez poética, é dedicada a quem se demiitu de me amar por inteiro. Mas também tem de sê-lo a esses seres maravilhosos, todas as mulheres deste mundo que têm um coração capaz de se apiedar com a visão de um cão abandonado na rua.